Cortes na lista do supermercado, cancelamento de serviços, adiamento de viagens e cursos. Com a inflação persistente e mais espalhada pela economia, situações assim viraram realidade para muitos brasileiros nos últimos meses.
Após atingir em cheio os mais pobres, a escalada dos preços também força mudanças na rotina de outras camadas da população.
Em janeiro, o índice oficial de inflação no Brasil teve alta de 0,54%, informou nesta quarta-feira (9) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Trata-se do maior resultado do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) para o mês desde 2016 (1,27%). Em 12 meses, o indicador acumula alta de 10,38%.
Um dos pontos que preocupam analistas é a sinalização de que a inflação, além de persistente, ficou mais disseminada nos últimos meses.
Em janeiro, 8 dos 9 grupos de produtos e serviços pesquisados tiveram alta de preços, com destaque para o impacto de alimentos e bebidas (1,11%).
No período, o índice de difusão calculado pelo IBGE foi de 73%. O indicador mede o percentual de produtos e serviços que tiveram alta de preços, em uma amostra com 377 subitens. Quanto maior ele for, mais difusa é a inflação.
Janeiro foi o segundo mês consecutivo com o índice acima de 70%. Em dezembro, estava em 75%. Um ano antes, em janeiro de 2021, esse percentual era de 66%.
“A alta agora está mais disseminada do que em 2021, com exceção do mês de dezembro”, disse André Filipe Almeida, analista da pesquisa do IBGE.
Segundo ele, o quadro está relacionado em parte com a pressão de custos e o desarranjo das cadeias produtivas ao longo da pandemia. Com o aumento nas despesas de insumos e operação, empresas tendem a fazer repasses para os preços de bens ou serviços.
“A inflação está mais espalhada. Não há dúvidas”, avalia o economista Fábio Astrauskas, sócio-diretor da Siegen Consultoria.
O cardápio de refeições não escapou dos efeitos da alta de preços. O consumo de carne diminuiu na pandemia, e a compra de frutas e legumes passou a ser feita apenas em dias de ofertas no supermercado. Idas a restaurantes só em ocasiões especiais, como aniversários.
Reportagem recente do Jornal a Folha mostrou que, após castigar os mais pobres, a crise gerada pela pandemia começa a afetar com maior força a renda do trabalho da classe média-alta nas regiões metropolitanas do Brasil. A conclusão é da sexta edição do Boletim Desigualdade nas Metrópoles.
Na visão dos responsáveis pelo estudo, o quadro reflete a combinação entre fraqueza da atividade econômica e escalada da inflação —os dados levam em conta o avanço dos preços no país.
Os responsáveis pelo boletim ponderam que, mesmo com as perdas, as famílias com rendimentos maiores atravessam a crise em uma situação bem menos dramática do que os mais pobres, já que elas possuem mais condições financeiras.
Durante a pandemia, a combinação entre inflação persistente e renda fragilizada fez brasileiros buscarem doações e até restos de comida para alimentação.
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