O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) vai se reunir, pela penúltima vez este ano, hoje, dia 26 (terça-feira) e 27 (quarta) para decidir sobre uma nova alta na taxa básica de juros, a Selic. O Comitê já sinalizou que pretende aumentar novamente a taxa, que hoje está em 6,25% ao ano, em 1 ponto percentual, a exemplo do que fez nas últimas duas reuniões. Boa parte dos analistas, contudo, aposta numa elevação ainda maior.
A tendência de alta de juros começou ainda em março, quando o país estava no auge da segunda onda da pandemia. De lá para cá, a inflação disparou e já ultrapassou 10% no acumulado em 12 meses. Em setembro, última data da medição do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou que a inflação mensal ficou em 1,16% — a pior para mês desde o início do Plano Real, em 1994. A alta de juros é a principal ferramenta do Banco Central para tentar conter o custo de vida, já que o consumo é desincentivado e fica mais caro tomar crédito, por exemplo.
O mercado financeiro, no entanto, acredita que a intervenção deve ser mais ousada. Casas de análise e corretoras apontam que, diante do rápido avanço da inflação, o Copom deveria aumentar a taxa em 1,25 ou 1,5 ponto. Essa percepção ganhou força após o governo ter decidido, na semana passada, romper o teto de gastos para viabilizar um gasto extra de R$ 30 bilhões com o Auxílio Brasil, programa que o presidente Jair Bolsonaro quer implantar no lugar do Bolsa Família, criado no governo petista.
Com a desmoralização do teto, principal âncora fiscal para impedir o crescimento da dívida pública, o dólar disparou, acentuando as pressões sobre a inflação. Além disso, dados do IPCA mostram um elevado índice de difusão, ou seja, o número de produtos e serviços que têm registrado alta de preços é elevado. Por isso, e diante da falta de ajuda da política fiscal, o BC seria obrigado a usar os juros para conter a febre inflacionária.
Demanda
Parte dos especialistas, contudo, acredita que nem mesmo uma alta maior dará jeito na inflação, já que a alta nos preços no país tem a ver com o aumento do valor das matérias-primas para a produção nacional e não com o excesso de demanda. É o que afirma o economista Felipe Queiroz, pesquisador da Universidade Estadual de Campinas.
“Esse sistema (de aumento da Selic) só vale quando a inflação é de demanda. Mas o nosso problema não é esse. Se fosse, teríamos pleno emprego, consumo em alta, famílias com acréscimo real de renda. Nossa inflação é de custos, de fatores de produção. Aumentar os juros não vai resolver a inflação”, disse.
“Aumentando os juros, não vai fazer chover, não vai diminuir os custos dos fretes, não vai diminuir os custos de produção”, acrescentou Queiroz. Para ele, o governo deveria usar um mix de política econômica para reverter a alta inflação, mas não o faz porque acredita que o mercado se autorregula, ideia defendida pelos economistas de linha liberal, como o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Segundo Queiroz, com esse cenário, a tendência é de que o mercado pressione por uma alta maior nos juros porque a inflação “estourou o teto”. Já Hugo Iasco-Pereira, doutor em economia pela UFMG, também ressalta que a inflação de demanda não é o caso do Brasil no atual momento. “A inflação de demanda é quando a gente tem uma economia muito aquecida, de tal modo que a demanda excede muito a oferta e isso gera um aquecimento da economia”, comentou. Ele acredita, também, que aumentar os juros agora pode comprometer a recuperação econômica do país no pós-pandemia.
“Certamente, elevar a taxa de juros agora faz sentido dentro do regime de metas de inflação, mas, numa visão um pouco mais crítica, não vai ter tantos efeitos de controlar a inflação. A gente eleva a taxa de juros e os empréstimos ficam mais caros, o consumo fica mais caro e a gente vai matar o paciente que está com febre. Não faz sentido nesse contexto”, disse. Para Iasco-Pereira, um dos principais problemas que contribui para a alta da inflação é a dependência do país de insumos básicos importados. “Assim, os custos das empresas dependem em muito da taxa de câmbio. E se ela desvaloriza, os custos aumentam, e isso é repassado para os preços, o que configura a inflação”, completou.
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