A nota de R$ 200 completa dois anos nesta sexta-feira (2). Com ares de raridade, só uma a cada quatro cédulas existentes nesse valor circulam atualmente no mercado. Em outra frente, a inflação corroeu 19,6% do poder de compra da estampa do lobo-guará, que hoje vale só R$ 161.
Especialistas consultados pelo UOL apontam que o sumiço da nota de R$ 200 ocorre porque cada vez mais pessoas armazenam grandes quantidades da cédula em casa. A prática, chamada de “entesouramento”, não é ilícita, mas pode facilitar crimes como evasão fiscal e lavagem de dinheiro. Outra hipótese é que a popularidade do Pix tenha levado menos consumidores a usarem dinheiro em espécie.
A cédula foi criada pelo BC (Banco Central) no primeiro ano da pandemia de covid-19 para evitar eventual desabastecimento de papel-moeda entre a população. Alvo de memes desde o seu lançamento, a estampa com o lobo-guará havia sido aprovada nos anos 2000 e estava guardada para ser usada caso surgisse a necessidade de criação de uma nova cédula.
Esse momento chegou com o pagamento do Auxílio Emergencial de R$ 600 em 2020, medida de alívio à pobreza coordenada pelo Ministério da Cidadania em parceria com a Caixa Econômica Federal.
“Então, no lugar de distribuir seis notas de R$ 100, a Caixa pagaria o benefício com três de R$ 200. Nisso, houve um benefício logístico”, explica Carla Beni, economista e professora da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
O que aconteceu com a nota de R$ 200
O governo federal retém atualmente 312,5 milhões (74,4%) das 420 milhões de notas produzidas no início da pandemia. A especialista da FGV aponta dois motivos pelo sumiço da cédula de R$ 200. O principal é que lojistas não querem receber notas de alta denominação porque elas dificultam o troco.
Como consequência da baixa demanda provocada por essa rejeição, as instituições financeiras não solicitam ao BC mais cédulas nesse valor. “É uma nota que equivale a 20% do salário mínimo, criada para ter baixa circulação. Além disso, o uso do Pix reduz a utilização de dinheiro em espécie”, diz Beni.
De acordo com o BC, o meio de pagamento eletrônico chegou a representar 10,6% do total de pagamentos de varejo em 2021. O crescimento médio mensal do volume de transações foi de cerca de 12%. A maior parte das transações continua sendo entre pessoas, havendo potencial para expansão nos demais casos de uso.
De acordo com o BC, o Pix chegou a representar 10,6% do total de pagamentos de varejo. O crescimento médio mensal do volume de transações foi de cerca de 12%. A maior parte das transações continua sendo entre pessoas havendo potencial para expansão nos demais casos de uso.
A nota de R$ 200 vai sair de circulação?
Não há planos do BC para descontinuar o uso da nota de R$ 200. “A entrada em circulação da cédula de R$ 200, assim como aconteceria com qualquer outra nova denominação, ocorre de forma gradual e de acordo com a demanda da sociedade. O ritmo de utilização da cédula de R$ 200 vem evoluindo em linha com o esperado, e seguirá em emissão ao longo dos próximos exercícios”, diz a instituição em nota ao UOL.
“A nova cédula foi incorporada à Segunda Família de Cédulas do Real e passou a compor o meio circulante do país por tempo indefinido.”
O advogado André Castro Carvalho, vice-presidente do IBDEE (Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial) diz que ela facilita a logística de criminosos.
“Fácil alguém roubar um mercadinho com notas como a de R$ 200 do que outro que esteja cheio de cédulas de R$ 20. Na pandemia, muitas pessoas estavam entesourando recursos por conta da incerteza que se pairava, correndo-se o risco de desabastecimento de dinheiro em espécie; mas a implementação de uma medida permanente como a criação de uma nota de alta denominação não faz sentido para um problema temporário”, analisa.
R$ 200 hoje compram menos que em 2020
Com a corrosão do poder de compra provocado pela inflação, o valor da nota de R$ 200 em julho de 2022 (último dado disponível) é 19,6% menor que em setembro de 2020, em valores corrigidos pela inflação. Isso significa que a cédula de R$ 200 tem hoje poder aquisitivo equivalente a R$ 161.
Dados do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) analisados pelo UOL mostram que compras para um almoço simples com 1 kg de carne bovina (R$ 45,68) e outro de feijão (R$ 8,68), 5 kg de arroz branco (R$ 19,60), 1 kg de batata (R$ 6,30), 1 kg de tomate (R$ 6,77), 1 kg de banana (R$ 9,37), 5 kg de açúcar (R$ 20,75) e 1 L de óleo (R$ 10,30) custam hoje R$ 127,45 na cidade de São Paulo.
Com itens para o café da manhã e lanches no carrinho, como farinha de trigo (R$ 6,27), pão francês (R$ 17,20), café (R$ 41,44) e manteiga (R$ 62,05), o valor de uma compra no supermercado chega aos R$ 254,41.
Em 2020, a carne custava R$ 32,07; o litro de leite, R$ 4,64; o quilo do feijão, R$ 6,96; 5 kg de arroz, R$ 15,85; a farinha de trigo, R$ 4,77; a batata, R$ 4,06; o tomate, R$ 4,03; o pão, R$ 13,23; o café, R$ 21,14; a banana, R$ 6,87; 5 kg de açúcar, R$ 12; o litro do óleo, R$ 4,16; e o quilo da manteiga, R$ 45,35. A soma dá R$ 175, ou R$ 79,28 a menos que em 2022.