A intensa digitalização de serviços financeiros levou os bancos a encerrar o ano passado com 7.216 agências físicas, menor quantidade desde 2010. Somente em 2022, foram encerradas 428 unidades, segundo levantamento feito pelo Valor com em dados do Banco Central (BC).
O movimento foi intensificado desde a pandemia, quando houve uma migração forte do atendimento para os canais digitais. Eles já representam a grande maioria das transações bancárias, que antes eram feitas em agências. Ao mesmo tempo, as grandes instituições financeiras passaram a investir na abetura de “lojas” — unidades para atender o cliente de forma presencial, mas que não têm a estrutura de caixa, segurança e retaguarda necessária a uma agência.
O surgimento de novos competidores também contribuiu para a digitalização. Na contramão da presença física dos bancos, o número de participantes do mercado aumentou 11% no mercado brasileiro em 2022, com crescimento concentrado em fintechs de crédito e instituições de pagamento. No período, foram criadas 71 instituições, elevando o total para 710.
A redução do atendimento presencial ganhou força a partir de 2018. De lá para cá, 3.973 agências encerraram as atividades. Nesse mesmo intervalo, o sistema financeiro cresceu 29,6% em número de instituições.
Em 2022, eram 109 sociedades de empréstimo direto e entre pessoas (SCDs e SEPs), que são as fintechs de crédito, 35 a mais que no ano anterior, aumento de 47,3%. As instituições de pagamento, por sua vez, somavam 74, o dobro do registrado em 2021.
A professora de finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) Claudia Yoshinaga avalia que houve, em alguma medida, digitalização financeira da população mais pobre, especialmente após a criação do sistema de pagamentos instantâneos, o Pix. “A pandemia [de covid-19] acelerou muito o processo de digitalização do sistema financeiro, mas já era um movimento em curso. Com o isolamento social, muita gente foi forçada a aderir aos serviços virtuais, inclusive grupos que eram mais reticentes, como idosos”, afirma.
Porém, ela faz a ressalva de que o Auxílio Emergencial inflou os dados de pessoas bancarizadas no período. “Elas automaticamente tiveram conta digital aberta, então teve esse efeito, mas não necessariamente significou digitalização da população de fato.”
Mesmo com o crescimento expressivo em número de instituições, as fintechs ainda representam pouco no volume de crédito e de depósitos do sistema financeiro. “O Brasil ainda sofre muito com concentração bancária, temos poucos bancos detendo muito dos serviços financeiros disponíveis, essa concentração gera sintomas macroeconômicos negativos, com serviços caros e baixa eficiência”, diz o presidente da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), Diego Perez.
Com o tempo, a tendência é que as fintehs cresçam em número de instituições e em participação no mercado, especialmente em produtos para nichos específicos e personalizados, acrescenta. Para o executivo, a agenda de competição e inovação do BC impulsionou o mercado. “Essa competição também faz com que os ‘players’ grandes tenham que rever o modelo de negócio, com digitalização de produtos e para alcançar clientes que não chamavam atenção”, afirma.
Yoshinaga, da FGV, observa que o boom de fintechs e instituições de pagamento, que oferecem uma conta digital simplificada e normalmente gratuita, também tem ajudado a incluir jovens no sistema financeiro.
Nos grandes bancos, a digitalização do atendimento se concentra sobretudo nas instituições privadas. Enquanto neles há uma queda no número de agências, a situação é diferente nos dois principais bancos públicos do país: Banco do Brasil (BB) e Caixa mantiveram relativamente estável o número de agências nos últimos trimestres, na intenção de atender uma parcela da população que tem mais dificuldade de acesso físico a postos de outros bancos.
No balanço do quatro trimestre, publicado na última semana, a Caixa indicou que tem 3.372 agências físicas no país, mesmo número registrado no terceiro trimestre. Em 2021, o número era um pouco superior, quando chegou a 3.403.
No BB, um plano da instituição financeira de enxugar um pouco a rede física foi um dos motivos que levaram à queda do então presidente, André Brandão, em 2021, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Na ocasião, ainda em janeiro daquele ano, o então mandatário da República decidiu que o demitiria devido ao plano de reestruturação do banco, que envolvia o fechamento de agências. Bolsonaro voltou atrás, mas o executivo acabou saindo algum tempo depois.
De acordo com dados do último balanço financeiro, o BB encerrou 2022 com 3.983 agências, número que é até superior ao de 2021, quando o banco contava com 3.979 unidades.
Além das agências, existem no país 11.593 postos de atendimento (PA). Em 2018, eram 10.914, ou seja, houve uma alta de 679 (ou 6,2%) no período. Os PAs são estruturas mais simples, subordinados a uma agência, e não contam, por exemplo, com serviços como câmbio, operações de tesouraria, fundos de investimentos para clientes qualificados, entre outros. Muitos nem são abertos ao público geral, e sim voltados ao atendimento dentro de empresas, repartições públicas, universidades etc.
Em paralelo a esses modelos de atendimento físico tradicionais, os bancos vêm convertendo antigas agências em lojas, com estrutura ainda mais simples que a de um PA. São locais voltados unicamente ao relacionamento comercial com clientes e a serviços de assessoria financeira. Dessa forma, reduzem gastos.
Não há um dado consolidado sobre essas lojas. Em relação às estruturas tradicionais, no Itaú Unibanco, em dezembro, havia 2.786 agências e 657 PAs, ante 3.530 agências e 703 postos há cinco anos. No Bradesco, eram 2.864 agências e 3.524 postos, ante 4.617 agências e 3.824 postos. E no Santander, eram 1.701 agências e 1.266 postos, de 2.283 e 1.267.
A Febraban afirma, em nota, que as instituições “estão adequando suas estruturas à nova realidade do mercado”, em que a utilização dos canais digitais de atendimento vem ganhando espaço. “O número de postos de atendimento bancário em operação no Brasil tem se mantido estável ao longo dos últimos anos. Na comparação entre 2020 e 2021, último dado disponível do levantamento, esse número variou de 37,8 mil para 37,5 mil, de acordo com a última edição da Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária.”